TEXTO – NÚMEROS 12:1-6
TEMA – COISAS DE FAMÍLIA
ICT – UM APARENTE E CORRIQUEIRO DESENTENDIMENTO ENTRE IRMÃOS SE TORNA NUM GRANDE INSTRUMENTO DA REVELAÇÃO DIVINA, EMBORA EXIBA TRAÇOS DE AMBIÇÕES DE CARÁTER PESSOAL.
OBJETIVO GERAL – LEVAR A CONGREGAÇÃO AO ENTENDIMENTO DE QUE A ELEIÇÃO DIVINA É SOBERANA E, ACIMA DE TUDO, INQUESTIONÁVEL.
OBJETIVO ESPECÍFICO – LEVAR A CONGREGAÇÃO AO ENTENDIMENTO DE QUE NÃO SE PODE QUESTIONAR A ELEIÇÃO DIVINA, E COM ARGUMENTOS SÓRDIDOS E DISCRIMINATÓRIOS.
TESE – É SEMPRE O SENHOR QUE ESCOLHE COM QUEM FALA E DA FORMA QUE LHE APROUVER.


INTRODUÇÃO



     Alguns esclarecimentos nestas palavras introdutórias se fazem necessários. Até porque, a minha preocupação neste momento visa não contaminar a leitura deste texto com uma retórica antirracista. Sob pena de se perder o foco, não considerando uma série de outros ensinamentos e lições que se pode extrair deste texto. Isto não significa afirmar a não existência de material para se trabalhar sob a temática do racismo. Há sim, porém é necessário maturidade e equilíbrio em sua abordagem.
Um bom caminho para se explorar esta passagem é a desavença ocorrida entre três irmãos. Sendo que dois deles se sentem prejudicados pelo terceiro, uma que vez que este é o líder de um povo. Eu diria que, do ponto de vista de um patriarcalismo, que é a visão e o modo de estruturação das muitas sociedades do mundo antigo, especialmente nesta região do médio oriente. Não é muito sem justificativa o questionamento desses dois irmãos.


     Moisés não é o filho primogênito de Anrão e não foi criado com sua família. Naturalmente podem surgir algumas divergências que são muito mais corriqueiras do que se possa imaginar no âmbito do convívio familiar. Daí o objetivo de começar o desenvolvimento dessa leitura a partir de uma ótica peculiar a todos nós. Que são nossas relações familiares.

     O texto também ressalta que diante da murmuração dos seus irmãos, Moisés conseguia manter a sua natureza e qualidade maior de ser um homem manso e não afeito a ira. Também não se pode confundir essa qualidade do seu caráter com a passividade de um líder. Ao pensar assim, trago em mente a própria formação de Moisés como um príncipe no Egito. A fuga para o deserto, o casamento, os filhos e tudo o mais que lhe ocorrera até o exato momento desta narrativa. Em cada uma dessas situações são perceptíveis os elementos que contribuem na modulação de sua pessoa como alguém extremamente equilibrado e cônscio de que havia ainda uma grande jornada como líder a frente de seu povo.


     Entretanto, se o murmúrio de Miriam e Aarão não incomodou Moisés, o mesmo não se pode dizer com relação a Deus. Por causa de que este incômodo chegou ao Senhor? Podemos imaginar, e isto foi colocado no início desta palavra, que situações como esta são muito mais corriqueiras no interior das famílias, e na relação entre irmãos. Mas então porque um questionamento como este incomodou ao Senhor?


     O que se perceberá mais a frente e no transcurso e desenvolvimento desta narrativa, é que ao se questionar Moisés, Miriam e Aarão estão questionando o próprio Deus e a sua soberania. Esta característica já era percebida desde que Moisés retornou do deserto e a maneira como se portava estando na presença de Faraó. A relação ali era de divindade para com divindade. O Faraó era a presença viva do Deus Hórus e Moisés representando o Deus sem nome dos hebreus. Logo, o que se pode depreender, é que ao se questionar Moisés e a sua liderança, questiona-se o próprio Deus. Evidentemente que este tipo de atitude não passaria impunemente.

   
     Desejo voltar agora ao inicio desta introdução e pelo fato de ter feito menção de que não queria naquele momento contaminar a leitura deste texto com uma retórica antirracista. E continuo firme com este pensamento. Todavia, temos que lembrar que o argumento utilizado para se questionar a liderança de Moisés foi pelo fato de Moisés ter se casado com uma mulher CUXITA (I Crônicas 1:32-33; Gênesis 25:1-4). Estamos falando de Zípora, filha de Jetro e sacerdote de Midiã (Êxodo 18:1).
Não vejo nesta passagem, um argumento sólido pra se falar contra o preconceito sob a perspectiva racial por causa da pele negra de uma pessoa. O que existiu nesta passagem foi uma clara restrição à mulher de Moisés por ela ser CUXITA, mas não necessariamente por ser negra. Algumas versões que acompanham a Bíblia Grega traduzem o termo relativo à origem étnica de Zípora como uma mulher etíope. Este termo na língua grega tem sua raiz no verbo AITHO_ Queimar + HOPS _ Rosto, ou seja, ETHÍOPE é aquele que tem a face ou rosto queimado, bronzeado e escuro. E por conta dessas informações, precisamos entender que este tipo de definição reflete e interfere na narrativa do texto e é uma perspectiva europeia e branca.


     Todavia, a restrição dos dois irmãos de Moisés mesmo que não esteja carregada deste discurso racista que, não deveríamos, mas estamos habituados a conviver com ele hoje. Essa restrição é uma restrição étnica. Zípora era cuxita, midianita. Tinha a pele facial negra, escura. Dá pra entender o porque de se fazer uma ressalva sobre a coloração facial da pele de Zípora, não dá? Afinal de contas, não podemos imaginar que estamos olhando para uma mulher da mesma forma como olhamos hoje no Brasil, principalmente quando vamos à praia. E devido a uma série de circunstâncias, inclusive climáticas, geográficas, etc.


     O argumento para o murmúrio de Miriam e Aarão foi o casamento de Moisés com uma mulher cuxita . Enquanto murmúrio, isso jamais incomodou Moisés e, muito menos, o tirou do sério. Mas quando esse murmúrio se transforma em um questionamento da liderança de Moisés e atinge a sua pessoa. Ele se torna o principal elemento para a reivindicação de que o mesmo Deus que fala por Moisés também fala por eles.


     O questionamento que chega a Moisés também chega a Deus. E a ação divina é imediata e providencial. Pois os convoca à tenda da congregação, e lá, através de uma coluna de nuvem, junto à entrada da tenda, chama Aarão e Miriam pra que ouçam suas palavras e juízos. E em suas palavras, o Senhor esclarece o tipo de relação que possui com Moisés e o tipo de relação que possui ou pode possuir com um profeta. E fica claro que a relação que Deus tem com Moisés é uma relação “face a face”. Em algumas versões não face a face, mas “boca a boca” (STOMA KATA STOMA) expressão presente no texto da Septuaginta. O que está claro a partir deste momento é que Deus tem um jeito único e especial de se relacionar com seu servo Moisés. E não é para ser questionado.


     Uma atitude como esta por parte dos dois irmãos de Moisés fará com que a Ira do Senhor sobre eles se levante. E o resultado foi que Miriam ficou leprosa. Alguns especialistas em AT entendem que Aarão também foi penalizado com a lepra na forma primitiva dessa narrativa. Entretanto, o texto deve ter passado por alguma reforma sob os cuidados da tradição sacerdotal. Subitamente movido por temor e assombro, Aarão agora e na função que lhe cabe como sacerdote intercede junto a Moisés por Miriam. Em sua fala, reconhece que ele e Miriam agiram como loucos e clama pra que este pecado não seja imputado sobre eles.


     Moisés fica sensibilizado com o ocorrido e clama ao Senhor para que sua irmã seja curada da lepra. A resposta do Senhor é aquela que está prevista na lei para os leprosos: Eles devem fica fora do arraial (acampamento) por, pelo menos, sete dias e depois será recolhida. Há uma dúvida levantada pela Bíblia grega quanto a ela ser recolhida; ou novamente admitida no arraial, uma vez que traduz o termo por purificada. Outro dado de extrema relevância foi que durante o tempo em que ela ficou confinada fora do arraial, o povo não partiu até que ela retornasse. Depois o povo partiu e foi acampar no deserto de Parã.



I – COISAS DE FAMÍLIA TÊM QUE ESTAR CIRCUNSCRITAS À FAMÍLIA. (V.V. 1-2)

     Precisamos entender este comportamento dócil e manso de Moisés desde uma perspectiva mais generalizadora. Não que com isso se queira depor ou contrapor a natureza do seu caráter. Pois estamos falando de alguém que carrega sobre si grandes responsabilidades. E que estava iniciando uma jornada de peregrinação no deserto e a frente de uma grande multidão, o seu povo.
Seu caráter e temperamento eram mais que apropriados para os grandes desafios que viriam. Assim sendo, Moisés era alguém capaz de minimizar dificuldades como esta surgida no seio de sua família. Mas é fato que essas vozes insurgentes vindas contra ele de onde ele deveria buscar apoio, a sua família, eram preocupantes.


     Mesmo assim, o fato de que no verso três a narrativa abra um parêntese com o objetivo ressaltar suas qualidades pessoais como mansidão e equilíbrio, o objetivo é mostrar como Moisés administrava conflitos. Isolando-os e não deixando que eles pudessem extrapolar sua origem e nascedouros.


     Se o problema é com a minha família, é também com ela que haveremos de solucioná-lo. Esta me parece ser uma estratégia utilizada por Moisés durante o tempo que esteve na condução do povo de Deus desde a saída do Egito.


     Já foi falado aqui que é desnecessário lançar mão desta narrativa com o objetivo de abordagem da questão racial ou racista por si só. Por outro lado, quando se quer criticar a alguém, qualquer motivo é motivo. E acho que essa foi uma das intenções pela qual Miriam e Aarão se valeram para que pudessem criticar a Moisés.


     Aarão e Miriam tinham tantos outros pontos da vida do irmão que poderiam explorar no sentido de questionar a ascendência do irmão caçula ao lugar de maior proeminência e liderança junto ao povo. Por exemplo, Moisés não era o filho primogênito e não foi criado e iniciado na cultura e religiosidade do seu povo. E, talvez, por isso tenha se casado com uma mulher não hebreia.


     Eles pegaram pesado com o irmão. Digamos que foi um golpe muito baixo. E essa tática de minar a liderança de alguém lançando mão de determinados artifícios tem sido uma tônica repetitiva ao longo dos tempos e muito mais comum do que parece. A sedução pelo poder acabou fazendo com que eles colocassem em perigo a relação de confiança que deve existir a partir de laços de família.
E uma vez sendo atacada a sua base familiar, surge um segundo questionamento. E este se relaciona ao monopólio e prerrogativa de que Moisés não detém a exclusividade do relacionamento com Deus, já que Deus também fala por intermédio deles.


     A narrativa ao relatar este evento torna mais evidente o caráter pessoal do Deus dos hebreus e sinaliza que sua soberania não está para ser ajuizada por quem quer que seja. Ao mesmo mostra que o objetivo e preocupação de Aarão e Miriam, é a busca por um protagonismo equivalente ao que Moisés desempenha junto ao povo.


     Pelo fato deste tipo de diálogo ser uma tentativa de interferir em sua soberania, o Senhor se manifestará teofanicamente de tal maneira que o seu descontentamento haverá de se tornar público. O conflito extrapolou a esfera da família e alcançou a esfera pública. Se a manifestação do juízo divino também não fosse pública, a figura de Moisés como líder investido de autoridade divina estaria seriamente comprometida. Este incidente deixará mais claro perante o povo que Moisés é o líder pelo qual Deus fala ao seu povo.


II – COISAS DE FAMÍLIA QUE EXTRAPOLAM PARA FORA DO AMBIENTE FAMILIAR (V.V.23-24)


     Na linguagem de hoje, acabam viralizando. Entre o comportamento suave, dócil e manso de Moisés está a contundente e insurgente crítica dos seus irmãos e a também reação contundente e imediata do Senhor. A ação de Deus, neste caso e por causa da repercussão, é pública. E se torna pública, pois ao convocar os três a saírem à tenda da congregação, não há como afirmar agora que tais acontecimentos ou desentendimentos sejam casos ou coisas de família. Eles se tornaram públicos e suas repercussões também são públicas.


     O Senhor viu que nos murmúrios estava um princípio de sedição, de insurreição. É ele que toma a iniciativa de zelar pela integridade da liderança de Moisés. Pois foi ele que soberanamente elevou Moisés ao posto de líder do povo de Israel. O que com clareza se conclui por meio desta narrativa é o fato de que quando alguém está à frente e na condução do povo de Deus é porque foi o Senhor que o conduziu a esta posição.


     A narrativa quanto ao problema enfrentado por Moisés é única e, portanto, não vamos fazer desta, a base para sucessivos mandos e desmandos que atualmente ocorrem no seio do povo de Deus (Igreja), e praticados por pretensas lideranças. O preceito básico está no fato de que o texto não deve servir para sucessivas generalizações. Por outro lado, há um natural nível de extrapolação desde uma reflexão como ponto de partida de comparação com uma situação mais concreta e atual que experimentamos em nossa realidade eclesiástica. O conflito familiar no seio da família de Moisés passou literalmente para a esfera pública.


     Temos enfatizado o espirito de mansidão como uma das principais características de Moisés. E em função disso é o Senhor que reage e sai em sua defesa. E sem nenhuma redundância a ação de Deus em favor de Moisés é providencial. E doravante também será uma ação pública. Sair e se dirigir à tenda da congregação tem relação com o juízo divino que tenha um alcance com consequências específicas; ou que tenham um alcance maior e as consequências resulte numa interferência na condução do povo.


     Neste caso, embora as consequências sejam específicas e circunscritas a uma família, elas, por estarem relacionadas ao maior líder entre o povo, têm peculiaridades pedagógicas e servem para mostrar que é Deus que tem colocado Moisés na liderança de seu povo.


III – COISAS DE FAMÍLIA TAMBÉM SÃO PASSÍVEIS DE JUÍZO DIVINO (V.V. 5-7)


     No início era uma rixa corriqueira entre irmãos. São típicos problemas que por serem corriqueiros são relativamente passíveis de serem administrados sem maiores traumas para as partes envolvidas. Mas, conforme o desenvolvimento da narrativa e abordagem que dela se tem feito até aqui, o problema acabou “viralizando” e nesta condição alcançou a esfera pública. Como consequência e a partir de uma estrutura política, social e religiosa quem haverá de proferir um juízo sobre a situação em questão é o próprio Deus.


     Conforme a convocação do Senhor Aarão e Miriam apresentaram-se diante dele para ouvirem suas palavras. O Senhor foi taxativo em afirmar que tem tratamentos diferenciados quando o seu relacionamento é com um profeta. Com estes basicamente a revelação de sua vontade ocorre por intermédio de visões ou sonhos. Mas o tipo de relacionamento que ele mantém com Moisés não acontece da mesma maneira. O que acontece com Moisés sintetizado pela expressão “face a face”, “Boca a boca” é real pelo compromisso do Senhor para consigo próprio. É a marca de sua fidelidade que permeia toda a teologia do AT.


     É de fundamental importância que possamos refletir sobre o tipo de juízo que Deus profere a Aarão e Miriam. Muito embora seu agir seja sempre pautado pelo seu ser misericordioso. Percebemos que há tanto níveis de chamada e responsabilidade quanto níveis de relacionamentos para com Ele. E não somente acontece um juízo punitivo e altamente pedagógico para Aarão, Miriam e extensivo ao povo. Aarão e Miriam aprenderão que o patamar de relacionamento que Deus tinha para com Moisés estava acima do deles e tudo isso por causa da prevalência da vontade soberana de Deus.


     Deus é soberano e age de maneira soberana e distintiva na vida dos seus escolhidos. A expressão que reivindica tratamento igual e justo para ambos os lados, neste caso, perde um pouco do seu sentido e força. Não podemos esquecer de que esta narrativa tem sua fundamentação no patriarcalismo e em tais condições o instrumental de reprodução simbólica é a relação entre o Senhor e os seus vassalos.


     Aarão e Miriam ao estarem na presença do Senhor sabem que estão na iminência de receber o juízo divino. O lado revelacional desse diálogo é que ao tomarem consciência do tratamento diferenciado com que Deus trata com Moisés e como Ele trata um profeta mostra claramente a transgressão de ambos. Questionar Moisés é questionar o próprio Deus.


     Podemos concluir que o patamar alcançado por Moisés diante Deus não é passível de qualquer tipo de questionamento por quem quer que seja e muito menos de alguns dos seus parentes mais próximos. Mas se alguém traz em mente algum exemplo que tipifique este grau de relacionamento entre Moisés e Deus me julgo no direito de dizer que não encontro nenhum paralelo na história que reproduza este relacionamento com tamanha propriedade. Até mesmo a ideia do Sumo Pontífice anteriormente atribuído ao Imperador Romano e por sucessão herdada pelo Bispo de Roma não cabe aqui.


IV – COISAS DE FAMÍLIA, MAS TRATAMENTOS DIFERENCIADOS. (V.V. 8-10)


     O ponto básico do questionamento dos irmãos de Moisés ao inquirirem o seu protagonismo a cerca da liderança por ele Moisés exercida junto ao povo e tão bem retratado e relatado no verso 2, é o fato de que entendem que tanto por meio de Moisés quanto por meio deles Deus tem falado.
Eles questionam esse protagonismo de Moisés junto ao povo e acham que é injusto pelas razões exposta no verso 2 e aludidas no parágrafo anterior. E depois disso e pelo fato de que não existe diferença entre a maneira como Deus fala por eles e também fala por Moisés. Agora aplicam aquilo que se pode chamar de golpe baixo. Não há nada mais aviltante e sem caráter do que se querer atingir alguém, mas mirando na sua família. Já dissemos aqui que outras tantas razões poderiam ser alegadas como argumentos que não legitimasse a ascendência que Moisés possuía junto ao povo como seu líder supremo. Ele não era o filho primogênito. Não foi criado com sua família e junto com seu povo etc. Mas o foco do argumento era sua família e mais especificamente sua esposa. Segundo a ótica e comportamento deles não viam nada em Moisés que fizesse dele um sujeito especial e acima da média.


     Isso devia ser o que eles pensavam de Moisés. Mas a resposta e reação divina, a maneira com que Deus distingue o tipo de ação por meio de um profeta e outra bem mais específica e especial por meio de Moisés. Evidencia que o tratamento dispensado por Deus a Moisés é diferenciado, embora ambos façam parte de uma mesma família.


     No mundo como o de hoje ter acesso a informações privilegiadas é fundamental para o desenvolvimento e crescimento dos negócios e empreendimentos. A cada dia que passa a mercadoria que mais se destaca em termos de valor agregado é a informação. E o tipo de relacionamento que Moisés tem para com Deus é de que ele tem acesso a Glória do Senhor. O Deus sem nome e desconhecido para a grande maioria do povo eleito. Que somente se revela por enigmas, visões e sonhos. É o Deus que com intimidade se relaciona com Moisés. Que foi escolhido por Ele.


     Estando Aarão e Miriam na presença do Senhor, Ele lhes pergunta pelo motivo de não temerem ao questionarem e murmurarem contra Moisés? Uma vez que nestas circunstâncias estavam falando contra o próprio Deus. A experiência trágica de punição para eles servirá como uma ação pedagógica. Eles agora entenderão que a função e ministério de Moisés é única e depende de uma confiança mutua. Tanto do Senhor para com Moisés quanto de Moisés para com o Senhor.
Se levantar contra Moisés é o mesmo que se levantar contra o Senhor. O resultado de ambos é suscitar a ira do Senhor. Ela será revelada assim que a nuvem se afastar de sobre a Tenda da Congregação. Então ela se revelará.


V – COISAS DE FAMÍLIA E EXPERIENCIAS AMARGAS, PORÉM DE GRANDE APRENDIZADO (V.V. 11-16).


     A lei é sempre um instituto que se coloca para que em uma ou outra eventualidade possa ser aplicada. Ela pressupõe independente de sua aplicação ou não um forte apelo pedagógico e educacional. E educa tanto os que, porventura, são punidos quanto àqueles que testemunham a sua intransigência diante da transgressão.


     A narrativa revela que através deste episódio narrado, o herdeiro do sacerdócio, que também esta entre os transgressores é quem testemunhará a punição imposta por Deus a sua irmã. É Aarão que com o recolhimento da nuvem, o símbolo da presença do Senhor, observará que Miriam foi acometida de lepra.


     Será também ele, reconhecendo o seu papel de sumo sacerdote, que invocará um pedido de perdão para que aquele pecado não fosse imputado sobre eles. Segundo suas palavras por causa da loucura e pecado deles. Agora ciente do papel relevante dado por Deus a Moisés, recorre à misericórdia de Moisés.


     Por outro lado, Moisés mesmo sabendo desse relacionamento de igual para igual para com Deus; Boca a boca _ Face a Face, nada disso lhe sobe a cabeça ou lhe faz passar do senso comum e do equilíbrio que todo líder precisa e deve ter. E é com esta humildade que vai a presença do Senhor para interceder a Deus no sentido de que o Senhor providenciasse a cura do flagelo da lepra a que sua irmã havia sido acometida.


     Moisés em súplica intercede por sua irmã e pede pra que ela seja curada. O Senhor não se exime de respondê-lo valendo-se do que a própria lei prescreve (Lev. 13:4-6). Ou seja, ela terá que cumprir tudo que a lei prescreve, até que seja declarada curada e assim possa ser reintegrada ao acampamento e convívio do povo de Deus. Neste caso, o prazo mínimo é de sete dias. Fato curioso é que quem haverá de declará-la limpa será seu irmão Aarão que também fez parte com ela desta sedição contra o Senhor.


     Podemos imaginar que tantos outros contra tempos como este se multiplicaram durante o período de peregrinação e travessia do povo pelo deserto. São situações que caso não sejam controladas contribuem para uma desordem generalizada e para atrasos constantes no cronograma dessa travessia. Sem contar que há sempre uma tendência de que o caldo dos insurgentes engrosse dificultando ainda mais a caminhada do povo até a terra prometida.


     O resultado prático de tudo isso é que Miriam, segundo a lei, teve que ser confinada fora do acampamento. Durante o tempo que vigorou esse confinamento o povo ficou estacionado até que ela fosse reintegrada ao convívio de todos.


     Podemos extrair desse acontecimento grandes aprendizados. Por mais que prezemos por nossas individualidades, em situações como esta, temos a obrigação de também pensar de maneira coletiva. Ou seja, pensarmos em função do bem comum. Apesar do deslize de Aarão e Miriam que culminou com a geração de um grande mal estar no meio do povo e por causa da ambição desses dois irmãos. Com isso um atraso de sete dias na trajetória do povo pelo deserto. Houve um gesto de solidariedade coletiva do povo para com Miriam que se traduz na espera de sua reintegração ao acampamento para que então pudesse prosseguir.


     O relato nos dá conta de uma profunda e amarga experiência tanto por parte de Moisés ao ser questionado por quem deveria estar ao seu lado e solidário com ele, os seus irmãos. E pela punição que receberam por agirem de tal maneira. Sem sombra de dúvida, houve um grande inconveniente e desconforto entre familiares. E acabou gerando um constrangimento público que Deus teve que intervir. Uma intervenção diretamente ligada a sua justiça, isto significa juízos com severas punições. Inexiste da parte do Senhor qualquer tipo de passividade, de tal maneira, que se depreenda, a partir do seu caráter revelado neste relato, sua transigência e cumplicidade com o pecado.


CONCLUSÃO


     A partir deste relato e do que por ele acabamos de refletir neste capítulo emocionante do livro de Números, não há como ficarmos alheios às circunstâncias aqui enumeradas. Como se um evento dessa natureza e magnitude sinalizasse apenas com seu lugar no passado e nada disso nos afetasse. O escritor aos Hebreus já fez e com grande maestria um movimento de olhar para o passado do seu povo. Não especificamente sobre este relato, muito embora este mesmo relato adequa-se sim a forma como ele faz a sua retrospectiva. Ele foi capaz de entender as múltiplas maneiras pelas quais Deus se manifestou, falou e operou maravilhas na vida do seu povo. Nem mesmo assim esses eventos são capazes de superar a forma única e sublime com que o Senhor nestes últimos dias se manifestou e tem se manifestado em seu filho.


     Semelhantemente ao escritor e historiador bíblico podemos sim refletir desde uma perspectiva histórica e religiosa que também afirmamos e reputamos como nossa. Embora a distância no tempo e a defasagem cultural entre o que é, propriamente dito, uma cultura moderna na qual nos incluímos e uma cultura nômade e patriarcal exige de nossa parte um exercício de extrema responsabilidade na interlocução entre as peculiaridades desses eventos que têm seu lugar no passado e as experiências que temos adquirido neste tempo presente.


     O que pode e deve ser fundamental em tudo isto, não pode se restringir a algum tipo de identificação com o ambiente da narrativa ou com as pessoas que nela estiveram envolvidas. Fundamental será sempre o tipo de sensibilidade que nos capacita a identificar as ações de uma divindade que tanto operou lá quanto tem operado cá entre nós, neste tempo presente. Ao fazer menção do escritor aos Hebreus sobre o entendimento das múltiplas e distintas manifestações divinas no passado desde uma perspectiva étnica e histórica comprovadas pelos relatos e experiências dos antepassados. O objetivo é uma tentativa de apropriação deste passado ciente de todas as dificuldades que este tipo de atitude traz consigo.


     O grande problema ou dificuldade está justamente em nossa capacidade de síntese. Pois, nem sempre estamos dispostos a abrir mão de uma reconstrução do passado desde um período e que adentremos a este passado com uma perspectiva histórica, cultural, religiosa e social. Somente assim corremos menos risco para não incorrermos em um anacronismo. E evitamos aquela falsa sensação de que somos capazes de adentrar ao passado automática e instantaneamente. Como se caíssemos de paraquedas no cerne e relato da questão.


     A certa altura do desenvolvimento desta prédica foi feita a observação de que uma das explicações para que o texto não faça menção de uma punição a Aarão é resultado de uma Reforma Deuteronômica que tenha ocorrido. Então, o copista que podia ser algum membro da classe sacerdotal em Israel omitiu qualquer tipo de punição. Ao mesmo tempo enfatiza a grande qualidade do Sumo sacerdote que através do seu olhar é quem diagnostica que sua irmã havia sido punida com a lepra. Essa é uma questão que em outra oportunidade poderá ser desenvolvida por levantar a possibilidade de que aquele que tem a capacidade de fazer diagnósticos está acima dos males e pecados do mundo.


     Como esta prédica desde o inicio tem seu caráter de instrução eclesiástica. Ela não é e não tem a intenção de ser uma mera atividade acadêmica. Sua proposição ou tese mostrou claramente que o objetivo era discutir alguns aspectos de uma provável desavença familiar. Algo tão comum hoje como era no passado. A própria narrativa é prova disso. E uma vez detectado e circunstanciado os motivos para essa desavença familiar, notadamente acabamos discutindo também a reação divina diante da situação estabelecida pelo relato.


     Existe uma metáfora conhecida dos mais antigos e que serve para ilustrar como funciona vontade de Deus em nossas vidas: Imagine que você esteja em um gigantesco transatlântico e, por conta disso, você tem a possibilidade de circular para todos os lados dessa embarcação. Entretanto ele tem o seu rumo traçado e independente da circulação dos transeuntes em seu interior, ele tem seu rumo e o capitão do navio não se desvia dele. Assim é a vontade de Deus.


     Aconteceram tantos outros infortúnios nesse ínterim de percurso do povo recém-liberto do Egito. Humanamente falando podemos afirmar que por conta desses infortúnios e contra tempos essa travessia se prolongou por pelo menos 40 anos. As dificuldades de relacionamentos entre famílias e intra familiares, que é o nosso caso aqui, se multiplicaram. Porém ao se olhar para o comprimento do tempo, comprimento e não cumprimento, Uma série de outras situações ou questões passíveis de serem suscitadas, ainda que em nada elas arranhem o conceito de soberania e vontade divina. Talvez fosse o caso de falarmos de um Deus absoluto e não arbitrário.


     Todos esses contra tempos foram capazes de provocar algum desvio aqui e ali da rota, mas nada que alterasse o objetivo final que era a chegada à terra prometida. Do ponto de vista do incidente e situação criada em que as partes envolvidas são a própria família de Moisés. Deus tomou providências. Mais do que isso, ele também proferiu juízos sobre seus irmãos insurgentes. Homem algum altera os propósitos divinos se o que está questão é a própria soberania divina.


     Não temos como concluir que pelo fato de o Senhor não se manifestar de maneira mais clara em outras situações, que ele seja condescendente com nossas ações pecaminosas. Fundamentalmente a pressuposição Deuteronômica de que a escritura é o elemento ajuizador das nossas ações e consequentes condenações está em vigência.


     Mais do que um passado relatado e discutido a partir deste texto, esta a retórica construída desde esta narrativa e que nos conduz a uma relação com o texto para somente por ele e a partir dele construir uma identificação com o passado e com as pessoas envolvidas neste passado. Logo, já não estamos falando de questões corriqueiras que acontecem no seio de nossas famílias. Já não estamos falando dos prováveis conflitos familiares. Estamos a partir destes conflitos construindo e uma relação de dependência com o Deus que agiu e interagiu grandiosa e gloriosamente no meio do seu povo. Que mantem com seu povo uma relação muito próxima e pessoal. Mas que paulatinamente o relacionamento com ele acontecerá escrituristicamente.


     A forma caleidoscópica com que olhamos e abordamos a história desse povo que avoca para si o status de povo escolhido por Deus é resultado de um matiz ideológico e de dominação, ao mesmo tempo omite que a reivindicação de tamanha honra demanda sobre si responsabilidade e juízo divino. Porém ainda que se imiscua este tipo de abordagem, até então, aleatória a tudo quanto se tem observado até aqui. Notemos que a pressuposição fundamental para a manifestação TEOFÂNICA de tal divindade, é provocado desavenças de família, peculiares e corriqueiras.

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