TEXTO - GÊNESIS 3:1-24

TEMA - Como posso identificar a origem do mal?

ICT - O texto aponta para um determinado lugar e contexto como sendo o apogeu de tudo que Deus tinha criado. Este lugar era um jardim que segundo a tradição criada sobre o mesmo fora chamado de paraíso. Não era e nunca foi um ambiente propício à prática do mal. E não foi por lá que o mal tomou forma, porém foi por lá que um tal ato de desobediência desencadeou o tal mal.

OBJETIVO ESPECÍFICO - Levar a congregação ao entendimento de que se o lugar e contexto onde o homem foi colocado não era propício a prática do mal e, consequentemente o início e desencadeamento de toda tragédia humana. Por que será que Deus consentiu?

OBJETIVO ESPECÍFICO - Levar a congregação ao entendimento de que enquanto o homem esteve na condição de uma emanação divina, mesmo sendo um ente criado com liberdade, ele não praticou o mal até que pecou pela desobediência.

TESE - O mal, e consequentemente o pecado, é próprio do homem. Porém, alimentado por uma intencionalidade e realidade diversa de sua natureza.





INTRODUÇÃO




     O capítulo 3 do Gênesis reproduz um cenário em que tudo afinal de contas já está criado. A Criação e seu consequente ciclo natural é uma obra acabada. Isto significa que não existe aquela história de que Deus, como querem alguns assim entender, é o criador do mal. Basta apenas que recapitulemos o que está registrado no capítulo 1:31 onde se afirma: "E viu Deus tudo quanto tinha feito, e eis que era muito bom. É evidente, que este olhar divino é único, e, entendendo que por Ele ser Deus, conhecedor do bem e do mal. A Criação é produto de sua moralidade. Gramaticalmente, neste verso 31 do referido capítulo 1 a principal referência que se pode fazer é que o olhar avaliativo divino de que tudo era muito bom significa que Deus criou todas as coisas que possuem substância e de tal maneira, por um processo seletivo, fez com que tudo fosse efetivamente bom. Então quando este verso 31 afirma que tudo que Deus criou era muito bom, não se fala de algum tipo de qualidade ou adjetivo e sim do substantivo, que é, segundo o bom português, aquilo que nomeia o ser. Em outras palavras, tudo que tem ser é obra divina.

     O segundo capítulo de Gênesis introduz uma segunda narrativa da criação. E não vou me ater àquele caráter específico e exegético da utilização de uma forma verbal para criar no capítulo primeiro(BARA) e outra forma verbal utilizada neste processo de criação no capítulo segundo(ASAH). Mas o que desejo destacar é que antes mesmo de o Senhor ter criado a mulher de uma das costelas do homem, no verso 17 do capítulo 2, Deus já recomendara ao homem pra que não comesse da árvore do conhecimento do BEM e do MAL. Neste segundo capítulo e devido a sua natureza descritiva do processo de Criação divina. O que se depreende é o fato de que com a criação da mulher e sua consequente apresentação ao homem. Ela está inserida dentro de um contexto que encerram duas perspectivas tanto a divina e o entendimento de que que o homem estava só e carecia de uma ajudadora e que segundo a avaliação adâmica é: "Ossos dos meus ossos e carne da minha carne". 

     O interessante neste tipo de recomendação divina quando nos concentramos no fato e nas justificativas para se fazer tal proibição tanto ao homem quanto a mulher no sentido de não tocarem e muito menos comerem da árvore do conhecimento do bem e do mal. Primeiramente, está no fato de que a questão cognitiva está diretamente relacionada ao ato de degustar, saborear. Nota-se também que degustar, saborear, mesmo que esteja identificado e restrito a satisfação ou prazer de apreciar um tipo de iguaria, não considera a hipótese de se extrapolar o reino vegetal. Logo, as regras estabelecidas ao homem para que vivesse no jardim(Paraíso) não se limitavam ao ato impositivo da parte do Senhor de não comer somente da árvore do conhecimento do bem e do mal que estava no centro jardim.

     A se pensar ou ajuizar na base dessa lógica a cerca do ato de degustar para se adquirir conhecimento, uma vez que o homem ainda não havia comido ou sequer tocado nesta árvore, ele ainda permanece como uma emanação divina. Entretanto desde que fora criado ele experimentou e fez uso de algumas das habilidades que necessariamente foram lhe conferindo algumas expertises: Nominar os animais era uma delas, ter sentimentos como o de solidão_ "Não é bom que o homem esteja só", O próprio ato ou trabalho de cultivar o jardim lhe conferia a habilidade de manuseio das plantas e também dos animais que como tais se alimentavam dos frutos e plantas deste jardim. Ou seja, ele conserva consigo a imagem e semelhança divina e o elemento de bondade com que Deus o criou. O homem como emanação divina é resultado da criação divina que é radicalmente boa. Há um sentimento de compromisso recíproco que mais ou menos se explicaria dessa maneira: Deus-Homem-Deus. Eu diria que estas observações têm algum tipo de aplicabilidade se, e somente se, pensarmos neste jardim criado e onde o homem e a mulher estiveram inseridos e encerrados num ciclo de ordem natural.

     O outro dado a se considerar era que ao lado da árvore do conhecimento do bem e do mal havia uma segunda árvore que era a árvore da vida. Imaginemos que a proibição fosse para que não se comesse do fruto da árvore da vida que também estava no centro do jardim. É fato que a partir do momento que se introduziu no mundo a noção de valor, atrelada a ela surge aquilo que se pode chamar de cobiça. Despertamento do sentimento de posse. Valor, cobiça, posse, todos estes elementos são cruciais para a construção de um mundo onde as relações humanas são estabelecidas hierarquicamente. E o que se depreende desde o momento da criação é a existência de uma graduação pela ordem natural com que as coisas foram criadas. Porém, sem um caráter impositivo decorrente de uma punição. A ideia de ordem que normalmente temos construído, entre outras coisas, sinaliza-nos no senso comum como uma maneira de se acabar com a desordem, com o caos. A ordem ou ciclo natural no jardim não tinha esta conotação. Antes, ela representa a maneira como Deus se faz presente no mundo natural.   

     No parágrafo primeiro foi feita a alusão de como a criação divina é BOA do ponto de vista de sua substantivação. E no segundo parágrafo acompanhando o pensamento desenvolvido no capítulo 2 quanto a proibição feita ao homem de que não comesse da árvore do conhecimento do bem e do mal. Que são duas características relacionadas à moralidade e a ética. Bem e mal qualificam o processo durativo ou não da ação verbal. Por conta disso, exibem valor adverbial, uma vez que, podem ser utilizados em sua caracterização: "Fulano se comportou mal hoje"; "Eles representaram bem a sala de aula". De uma maneira análoga esses qualificativos ilustram com propriedade o caráter e a potencialidade com que o homem fora criado. Ao mesmo tempo que o discernimento quanto à prática do bem ou do mal seria algo que o homem adquiriria naturalmente. E o que se percebe foi o fato de que o homem ao comer desta árvore que lhe fora proibida. Ele simplesmente pulou etapas de um processo que lhe daria este mesmo discernimento e com objetivos condenáveis. Pois o desejo de se tornar igual a Deus foi a motivação ou objetivo e, para tanto, não mediu as consequências, às quais lhes foram advertidas previamente.

     Pois bem, foi falado da proibição divina ocorrida no verso 17 do capítulo 2. Foi também indicado que a referida proibição ocorre antes da criação da mulher que acontece no verso 22 deste mesmo capítulo. É fato que se toda a criação é boa, tudo efetivamente gera, a partir da contemplação, prazer, regozijo, sensação de bem estar, felicidade, etc. O ambiente por si só não é capaz de gerar algum tipo de mal estar, desconfiança, ou qualquer outro tipo de situação desconfortante e desagradável. É o que sobrevém à mente ao se fazer referência ao termo PARAÍSO. Mas, mesmo assim, o homem, muito embora inserido num ambiente de bem estar como era o jardim. Era passível de sucumbir e ceder a tentação. A tentação toma ocasião de se imiscuir no ambiente do jardim. Uma vez que, no tipo de relacionamento entre o homem e Deus, percebe-se a existência de uma alteridade diferente do homem e de tudo quanto havia no jardim. Você pode perceber esta alteridade aqui nominada pela própria imposição para não se comer nem tocar na árvore. Pelo sentido de obediência em se prestar contas a Deus na viração do dia. Antes mesmo do cometimento do pecado pela desobediência, o homem já estava inserido sob as categorias da finitude, mesmo que ainda não tivesse tomado consciência das mesmas. 

     Entretanto, a situação das duas narrativas do Gênesis, tanto a do primeiro quanto do segundo capítulo, relatam não somente a forma como Deus cria o mundo, e já falamos bem superficialmente da utilização das duas formais verbais presentes nestes textos. Porém, precisamos estabelecer um parâmetro de que até esta altura da narrativa, e, pelo fato de Deus ter criado o homem a sua imagem e semelhança, inexiste qualquer tipo de polaridade que se antagonize ou rivalize com aquilo que Deus preceituou a Adão e por extensão a Eva. Adão é a expressão máxima e o consequente prolongamento do que Deus fez à criação ao mesmo tempo que se interpõe nela.

     Para efeito de um melhor entendimento, e para não entrar no assunto propriamente dito que permeia como preâmbulo do capítulo 3, e que será ainda objeto de apreciação, neste caso, a referência é sobre a desobediência. Ou seja, não dá pra falar de desobediência até o capítulo 2, já que o que existe entre Deus e Adão é que ambos compartilham de uma mesma mentalidade. Adão, o primeiro homem, é a imagem e semelhança de Deus(Gênesis 1:26-27). É o grande representante, é o próprio Deus a partir daquela realidade criada(Jardim do Éden).

     Porém ao adentrarmos o capítulo 3, surge uma polaridade nova, e esta representada pela serpente. Curiosamente, a serpente é serpente pois foi Adão(O homem que assim a denominou_ Gênesis 2:19_ E sua denominação é decorrente das qualidades vistas por Adão com relação à sua astúcia. A serpente segundo o relato iniciado no capítulo 3, era a mais astuta dentre todos os animais da terra criados por Deus. O objetivo deste texto é de se concentrar tão somente na narrativa. Vez  por outra, a tentação me vem e com ela a intenção de compará-la com alguma situação ou paralelo que ilustre bem o que se passa neste ambiente de jardim. Entretanto, como tudo ainda é muito incipiente, qualquer tipo de comparação ou analogia perderia muito de sua eficácia. E como a intenção aqui não é pular etapas. Tal como aconteceu a Adão e Eva desde o momento em que foram introduzidos no paraíso, e com objetivos bem definidos. Esta situação me lembra um pouco o mito transmitido pela relação conjugal entre Zeus e Hera. Que, por assim dizer, incorpora o ciúme e faz de tudo para atrapalhar a relação do marido quando este dá as suas escapadas. 

     O parágrafo anterior fez menção ao mito grego representado pela relação conjugal entre Zeus e Hera, e não foi sem motivo. Deus colocou a disposição de Adão todos os animais criados para que este os nominasse. E assim foi, todavia, mesmo o homem cumprindo com a determinação divina, ainda assim estes animais não eram e não seriam suficientes para completar o homem. Ele precisava de alguém que estivesse à sua altura. E o texto é claro ao esboçar o que Deus ao olhar para o homem disse: "Não é bom que o homem esteja só"(Gênesis 2:18). E o verso 20 complementa que depois dele ter dado nome a todos os animais, ainda assim não se encontrava uma ajudadora idônea.

     Feitas essas observações preliminares, agora podemos adentrar ao capítulo 3. E mesmo que não seja a intenção inicial deste texto apontar de forma mais incisiva e identificadora para a figura que se insurge e que está subjacente à própria serpente. Não nos esqueçamos que a atribuição de sagacidade dada a serpente foi produzida pelo homem. É intenção deste texto limitar-se tão somente ao atributo de uma polaridade até então não conhecida e que o instrumento de sua efetiva manifestação se dá pela sagacidade da serpente. Até aqui, toda a criação é uma obra divina, e se desconhecêssemos algumas características pelas quais identificamos o ser de Deus, ainda assim seria possível atribuir tudo que aí está a seu feito ou produto de suas mãos.

     Por outro lado, existe um dado que até o momento em que a serpente aborda a mulher não existia de fato, que é a relação dialógica. Uma relação dialógica somente pode existir com a presença de uma alteridade. Talvez seja por causa disso que a serpente em sua tentativa(Tentação) procurou a mulher e não o homem. Adão nominou a serpente e portanto, sobre ela tinha completo domínio, muito embora a mulher tivesse sido tomada dele. Ou seja, feita a partir dele. A mulher feita a partir do homem é uma emanação do homem(Ossos dos meus ossos, e carne da minha carne_ Gênesis 2:23). Uma vida humana somente pode ser gerada a partir de outra vida humana.

     É a proposição de uma relação dialógica que efetivamente fará com que tudo quanto foi criado seja de alguma maneira desconstruído. O uso do termo desconstruído é proposital. Ele já trás consigo uma ideia de hierarquização e racionalização das coisas. A tão chamada e propalada outra polaridade acena para a mulher com a possibilidade de que ela pode ser equiparada a Deus e ocupar o lugar que Deus ocupa. Quando a mulher olha para a árvore denominada de árvore da ciência do bem e do mal, o que ela vê?(Gênesis 3:6), Ela não viu nada de diferente das demais árvores que naquele jardim se encontravam e que foram criadas por Deus.

     O capítulo 2:9 relata que o Senhor fez brotar da terra toda árvore agradável pra comer. Não era somente a árvore do conhecimento do bem e do mal que era agradável a vista. Se todas as árvores eram boas de se comer e agradáveis aos olhos, por que será que a mulher se interessou justamente pela árvore que estava no centro do jardim, sendo que esta era proibida de se comer? Por ser esta a que lhe proporcionaria o conhecimento do bem e do mal, e, por conseguinte, conforme a versão da serpente faria com que se tornassem iguais a Deus?

     Já falamos aqui que na relação de Adão com Deus inexistia qualquer tipo de situação rivalizante entre ambos. Até mesmo uma situação desde uma perspectiva hierárquica inexistia. Tudo isto era decorrente até então da não presença de um olhar dimensionado por uma outra polaridade. Existe aquela pergunta clássica feita por Deus depois de ambos terem comido da árvore e por verem que estavam nus, esconderam-se da presença de Deus quando Este na viração do dia viera a eles. E nesta pergunta feita por Deus para se explicarem porque se esconderam, o homem responde que ao ver que estavam nus teve vergonha. E Deus então pergunta: "Quem te mostrou que estavas nu?"

     Se voltarmos um pouco antes do ato de Eva e Adão terem comido do fruto que lhes estava proibido. É um dado significativo destacar o fato de que muito embora a mulher tenha sido a primeira a lançar mão do fruto e o comer, os dois apenas se darão conta de que estão nus quando Adão também o come. A moralidade quanto ao certo ou errado é produto de uma relação de pessoa a pessoa. Esta moralidade extrapola as relações naturais de um mundo naturalmente criado. O projeto do jardim como uma espécie de laboratório, pode sim ser considerado como a possibilidade de uma relação interpessoal, mas que deveria preservar uma relação de obediência do homem para com seu criador.

     E a julgar pelo que foi colocado no parágrafo anterior, por que não considerar que o homem foi criado totalmente bom, porém com a possibilidade de que pudesse cair? Já que é também uma característica do homem, o fato dele ser livre. Este dado ou possibilidade é, de certa forma, identificado como aquilo que no teatro grego foi qualificado esteticamente como tragédia, ou a presença do elemento trágico que se insere no destino do homem. A despeito dessas observações preliminares, ainda persiste a grande questão que é aquela que também faz parte da temática deste texto. Ou seja, como posso identificar a origem do mal? 




I - NÃO ATRIBUINDO SUA ORIGEM A DEUS(V.V. 1-5)


     Já foi falado, cantado, celebrado aqui neste texto que tudo quanto Deus criou é bom. A criação divina é portanto boa. Então, devemos afastar de vez aquela ideia de que Deus quando criou o mundo, também criou o mal. Ora, isso é impossível. Então, como explicamos esta situação e que justifique a presença do mal no mundo. Não explicamos, apenas afirmamos que o mal inexiste enquanto ser criado. Ele é uma cortina de fumaça. Ou, quem sabe, uma simulação de situação que, a rigor tem algum tipo de plausibilidade pra que aconteça, mas não significa  que seja algo que de fato tenha acontecido ou tenha que acontecer. O mal é uma pseudo realidade, sem substancialidade

     Ajuda-nos muito nesta reflexão o fato de que em havendo uma quebra de autoridade. Uma vez que a determinação era de que não se comesse da árvore da ciência do bem e do mal que estava no centro do jardim. E ambos, tanto a mulher quanto o homem comeram desta árvore. Eles assumiram o ônus de uma consequência bastante danosa pra toda a Criação por conta desta desobediência: "Não comereis dele, nem nele tocareis para que não morrais". Ou seja, um dado na condição humana que inexistia, a perspectiva da morte. Ao mesmo tempo que ocorre a inserção de uma polaridade diversa do que era o ambiente e contexto do jardim(Paraíso). Uma polaridade-espelho e representativa, sinalizada como subjacente, ainda que não personificada neste momento, porém presente na astúcia da serpente.

     Vale ressaltar que não se constitui como intenção neste texto a utilização do ambiente do jardim apenas como moldura de todas as questões que eventualmente poderão ser levantadas dado ao aspecto dinâmico, porque não dizer, eletrizante de tudo quanto estava para acontecer e o que de fato aconteceu a partir das perspectivas que emergem dessa narrativa. E tudo isso, tem uma relação direta com o fato de que Deus ao criar o homem e ao colocá-lo no jardim, deu-lhe total liberdade. Ele(Deus) somente aparece neste capítulo pelo fato de que também ao criar o mundo e plantar um jardim e ter dado responsabilidades ao homem. Aparece sempre na viração do dia. Sua presença obedece a um ciclo natural imposto por Ele próprio na criação.

     Do ponto de vista da relação da mulher com a serpente e o tipo de diálogo estabelecido por ambas. Há sim a possibilidade de se deduzir que a serpente, dos animais do campo, era o que mais se equiparava ao homem, e, por isso mesmo, rivalizava com a mulher. A forma como o diálogo se desenvolveu, mostra bem o momento certo de uma abordagem. E que momento seria este? O momento ou instante em que a presença tanto de Deus quanto do homem como emanação do próprio Deus não se fazem presentes. A relação dialógica somente seria possível entre a serpente e a mulher. Pelo fato de que elas se rivalizavam. O uso do termo rivalizar alinha bem a ideia de que mulher e serpente estavam em um mesmo patamar hierárquico, a partir de uma perspectiva de relação de poder.

     Pois bem, afora a relação dialógica entre a serpente e a mulher. Já que neste primeiro momento, ela somente seria possível a partir delas. Uma possibilidade passível de ser aventada nesta relação dialógica é a de que a mulher tenha oferecido do fruto, que lhe fora proibido inclusive de ser tocado, ao homem, sem que o próprio homem soubesse de sua real proveniência. O texto em questão não se encontra no escopo deste tópico. Logo, ele ainda será objeto de de uma leitura, que espero que seja bastante elucidativa. Muito embora, ele tão somente afirma que após a mulher ter comido do fruto deu também ao homem e ele comeu.

     A intenção aqui não é necessariamente criar um espectro de teoria da conspiração com relação ao homem(Macho) em que tanto a serpente quanto a mulher estiveram envolvidas. Mas, buscar de forma descritiva, e, quem sabe, dessa maneira reproduzir uma situação de tal forma plausível que se possa afirma com bastante critério. Evidentemente, que tais situações até aqui aventadas, e, que precederam a queda do homem, realmente estiveram presentes neste ambiente. Este ambiente foi criado por Deus. Entretanto, desde que aventamos a possibilidade de que a relação dialógica somente seria possível entre a mulher e a serpente. Introduzimos uma espécie de discurso em que o diálogo é dialogo entre partes iguais. Deus e o homem ficaram de fora dessa relação dialógica entre a serpente e mulher.

     Neste tópico posto para desenvolvimento e que se inicia com uma tentativa de responder a grande indagação que faz parte da abordagem temática deste texto. De como posso identificar a origem do mal. E se nesta relação dialógica entre a serpente e a mulher nem Deus nem o homem se fazem presentes. Claro, que pelas razões que até aqui já foram listadas. Então, não tenho como indicar que a origem do mal está em Deus. Aproveito, inclusive, para identificar de minha parte, e para que eu não seja injusto para com Deus. Pois não é tão somente minha função responder neste texto que a origem do mal não está em Deus. Assim como afirmar que Ele é perfeitamente BOM em tudo que fez e faz. Muito embora, como também poderá ser visto mais a diante, seja conhecedor do bem e do mal.

     Então, por que efetivamente não posso, ou não tenho como atribuir a origem do mal a Deus? Bem, sabemos que o mal é uma forma ou faculdade adquirida e por onde podemos ajuizar as nossas ações. Se somos capazes de fazermos tais ajuizamentos, significa que estas ações se encontram no âmbito daquilo que nos qualifica enquanto seres animais dotados de algumas faculdades. Imagine que alguém vá comprar um carro. E na concessionária de veículos o vendedor te apresenta um modelo básico de automóvel. Mas, sem aqueles itens chamados de acessórios. Quando o projetista desenhou o automóvel, era o que se podia chamar de modelo básico. Tudo mais que o cliente desejar que seja agregado ao modelo em termos de acessórios, é por conta dele e, claro, também majora o valor daquele produto básico.

     Não custa nada lembrar que a entrada do pecado(Mal moral) no mundo, é produto de uma desobediência(HYBRIS). Tendo o homem desobedecido a Deus, o resultado foi que ele adquiriu conhecimento ou expertise sobre a prática do bem ou do mal. Já que a árvore em questão, era uma árvore de conhecimento. O aspecto cognitivo é muito importante e vale sim ser ressaltado neste momento. Entre o verso 3 e o verso 5 deste capítulo, onde o diálogo da serpente com a mulher se funda. No tocante a mulher, caracteriza-se pela advertência divina pra que não comesse, nem tocasse na árvore do conhecimento do bem do mal.

     A consequência de se tocar ou comer esta árvore é a morte. Da parte da serpente, esta proibição divina não era bem assim. A questão sobre uma consequência negativa para quem comesse da árvore é subvertida pela serpente, já que ao fazer menção de que o homem(Mulher) ao comer a árvore daria um salto tão grande que se equipararia a Deus. Sendo assim, a atitude da mulher e do homem ao comerem a árvore do conhecimento do bem e do mal, é uma atitude do homem em relação a Deus por ter omitido este dado referenciado pela serpente. 

    A serpente então apela para algo que ainda não se tinha ventilado e que afetava diretamente a situação e relação da mulher tanto para com o homem quanto para com Deus. Se equiparar a Deus foi primeiramente uma tentação direcionada à mulher. Eu posso então deduzir e ao mesmo tempo reforçar que o que a mulher desejou foi se equiparar tanto a Deus quanto ao homem. E não levar a sério a consequência danosa de que poderia morrer. Em parte, este ato de desobediência se justifica pelo fato de que a morte enquanto realidade e ameaça de existência ainda não era real. 




II - TALVEZ, EXERCITANDO A CAPACIDADE DE DISCERNIR O QUE É CRIAÇÃO E O QUE É IMITAÇÃO? (V.V. 6-10)

 
     Nos versos 8 e 9 do capítulo 2 do livro de Gênesis, encontramos o relato de que o Senhor após ter criado o homem plantou um jardim. Há inclusive detalhes sobre a localização geográfica deste jardim. O que estes versos e, em especial, o verso 9 nos diz é que todas as árvores plantadas no jardim eram agradáveis e boas para serem comidas. Assim como a árvore da vida e a árvore da ciência do bem do bem e do mal que estavam no meio do jardim eram também agradáveis. Ambas as árvores do centro do jardim representavam o limite do homem. Tanto que a mulher ao ser interpelada pela serpente a cerca do que se podia e do que não se podia comer no jardim, nos versos 2 e 3 responde que somente do fruto da árvore que está no meio do jardim não se podia comer e nem mesmo nele tocar.

     A clara referência a um limite imposto ao homem no jardim, pode ser entendido de tal maneira que se perceba uma ordem natural na própria criação. Isto redunda para pensamentos mais abstratos com os quais convivemos atualmente. Entretanto, não se pode omitir que havia sim uma ordem de caráter impositivo a que não se ultrapassasse esses limites. Não se pode também omitir o caráter distintivo de uma mente criadora e superior no estabelecimento de tais limites. O objetivo era sim o de preservar o elemento primordial da criação e o tipo de harmonia entre o homem(Coroa da Criação) e a Criação propriamente dita. Os elementos essenciais da gênese humana deveriam permanecer incólumes. Porém, uma distorção se aventou como possibilidade no tipo de diálogo que a serpente estabeleceu com a mulher. Esse tipo de distorção foi alimentada pelo desejo da criatura em suplantar a seu criador. Porém, no início, o desejo fica restrito tão somente a uma equiparação com o Criador. E foi o que moveu a mulher naquele momento.

     Não era somente a árvore da ciência do bem e do mal que era boa de se comer e agradável aos olhos. Todas as demais árvores do jardim tinham estas características. Porém, o verso 6 acrescenta uma outra característica a esta árvore. Pois, o ato de comê-la acrescentaria o discernimento ou conhecimento. Muito embora, as outras árvores que podiam e eram consumidas pelo homem fossem agradáveis, a árvore que estava no centro do jardim, a árvore da ciência do bem e do mal, além da função precípua estabelecida na criação de alimentar, repondo as forças ao homem, também acrescentaria conhecimento e discernimento das coisas. Agora pouco, no parágrafo anterior, foi feita a menção de uma distorção introduzida, ainda como possibilidade no diálogo da mulher com  a serpente. E a possibilidade aventada neste diálogo era no sentido de que os limites impostos por Deus e que visavam salvaguardar a harmonia do homem com a Criação da qual o homem também era parte, podiam ser transpostos sem que houvesse qualquer tipo de dano ao homem por tal transgressão de limite.

     Ora, o que a serpente fez foi transformar a verdade em uma meia verdade. Já que, no verso 4, ela altera aquilo que seria o dano pela desobediência: "Certamente não morrereis." _ E consequentemente no verso 5, afirma a mulher que se ela comer do fruto da árvore da ciência do bem do mal, os olhos se abrirão e tanto o homem quanto a mulher seriam iguais a Deus, uma vez que, saberiam discernir o bem do mal. Uma meia verdade é também uma meia mentira. A serpente argumentou e convenceu a mulher a comer do fruto. Ela não somente o comeu como também o deu a seu marido e ele, conforme o texto, comeu com ela. O verso 7 é taxativo ao dizer que imediatamente após comerem do fruto os seus olhos foram abertos e viram que estavam nus. A primeira providência deles após a constatação da nudez foi coserem folhas de figueira que cobrisse a nudez  ou vergonha. De certa forma, o que se percebe na atitude deste casal foi uma mudança de paradigma quanto ao relacionamento deles(Sexualidade) e a relação de ambos para com a criação e aquele jardim. As árvores, agora, não mais tinham apenas um valor comestível, uma vez que, as figueiras por intermédio de suas folhagens transformaram-se em uma forma de vestimenta.

     Ao ouvirem a voz de Deus passear pelo jardim por ocasião da viração do dia. A única atitude que o homem e a mulher tomaram foi de se esconderem da presença do Senhor por entre as mesmas árvores do jardim. Ou seja, mais uma utilidade das árvores além de fazerem uso delas para ocultarem de si mesmos a nudez ao fazerem aventais de folhas de figueiras. Agora, se valem dessas árvores para também se ocultarem da presença do Senhor. Mas, o Senhor chamando por Adão, pergunta onde estás? Adão, então responde a Deus que tendo ouvido a sua voz, temeu e se escondeu pelo fato de estar nu. A próxima pergunta do Senhor parte do princípio de que alguém lhe mostrara que estava nu? E, depois, completa com mais uma indagação: "Comeste tu da árvore que te ordenei que não comesses?". Pois bem, primeiramente, podemos abordar o fato que me parece ser sintomático quanto a ambos terem comido da árvore, ou seja, tanto a mulher quanto o homem. E a constatação de que ambos somente se depararam com a questão da nudez depois que o homem também comeu do fruto. E o texto é claro em registrar que primeiro a mulher comeu do fruto somente depois deu para que o marido também comesse do fruto.

     É justamente o fato de terem se escondido que chama a atenção neste verso de número 10. Esconder-se, ou mesmo, virar as costas para o Senhor. E, este é o desdobramento do comportamento rebelde e pecaminoso do homem. É o que de mais alarmante pode se deduzir. As atitudes tanto do homem quanto da mulher nessa busca de ocultamento ante a presença do Senhor caracteriza bem como será daqui pra frente o relacionamento que o homem manterá com Deus. Ao que parece, isso ilustra bem o que é um traço de duas linhas paralelas, ou seja, o princípio das paralelas que seguem em linha reta, porém, sem jamais poderem se encontrar. O Deus criador e sempre presente, e tudo o mais que caracterizava o ambiente do jardim onde o homem fora inserido e que vivia numa completa harmonia. Agora, tudo isso se desfaz, e, tudo por uma questão de desobediência ante a uma norma previamente estabelecida por Deus.

     A dificuldade adquirida pelo homem em decorrência de sua desobediência para com Deus. A partir de agora se intensificará de tal forma e o resultado mais imediato de tudo isto pode ser qualificado e é assim que a própria escritura qualifica esta situação, chamando-a de corrupção do gênero humano. É dentro deste arcabouço que também se enquadra todo tipo de construção ou produção humana e que acadêmica e convencionalmente denominamos de cultura humana. As próprias ações inventivas do homem tendem de alguma maneira criar situações e sensações de bem estar. A busca da felicidade é constante e com ela o sentimento de prazer, satisfação, gozo e plenitude. Sem dúvida adentramos o terreno de nossa existência. E a principal sensação que temos é de que perdemos alguma coisa. Fomos desligados, desplugados de um bem maior e lançados nessa aventura que agora chamamos de vida humana.

     A célebre pergunta deste tópico sobre o que é Criação e o que é imitação visa querer entender a nossa situação a partir do registro escriturístico em questão que é o capítulo 3 de Gênesis. Até o momento da queda, mesmo que, do ponto de vista da relação dialógica da serpente com a mulher tenha se estabelecido um instante antes da mesma, a única realidade e contexto de ambiente que existia estava relacionada ao ato criador de Deus e sua consequente sustentação com a participação e cooperação efetiva do homem. A apresentação da mulher ao homem foi uma forma sinalizadora nesta criação de que as coisas ainda eram bastante transitórias. Já que implicava em desdobramentos num relacionamento horizontalizado simbolizado pela presença da mulher. Foi neste processo de horizontalização de relacionamento que se interpôs a serpente. O diálogo que ela estabeleceu com a mulher dá a noção do que foi isto.

     Com a queda agora sendo um fato consumado. Aquela realidade primeira e sustentada por Deus em seu ato criador, perde sua força e vigência. Isto, do ponto de vista do homem, Não há nada que tenha sido alterado no ser divino. E a referência a uma perda trata-se do rompimento brusco e aviltante com que o homem deixa de se relacionar com Deus. O mesmo sentimento aterrorizante e o consequente afastamento de sua presença por conta da conscientização da nudez fez crescer o sentimento de vergonha. Tudo que virá a seguir consistirá por parte do homem em tentativas de simular pseudo realidades que reproduzam o que efetivamente ele tenha perdido quando possuía o relacionamento de comunhão e proximidade com Deus, o seu criador. Podemos até chamar esta situação pós queda de jogos de imitação. Ou, o limiar entre uma e outra situação ou realidade.




III - OUTRA FORMA E MUITO MAIS EFICAZ É A PERCEPÇÃO DE QUE, QUANDO NOS CORROMPEMOS, ACONTECE A MANIFESTAÇÃO DO JUÍZO MORAL DIVINO SOBRE NÓS (V.V.11-19).


     O que poderia ser entendido antes da queda como um princípio de ordem natural na criação. As regras já exibiam o seu lado normatizador para a convivência tanto entre o homem com a Criação quanto entre o homem e o próprio Deus e depois entre o homem e a própria mulher. E evidentemente que a questão moral ainda não era de fato algo a ser tratado uma vez que o homem ainda não possuía essa capacidade de discernimento. O homem era desprovido de uma capacidade moral. Por isso se justificava a presença de uma árvore como a que ao homem e a mulher lhe fora proibido terminantemente de se tocar nela e mesmo comer de seus frutos. Até mesmo a presença divina ocorria obedecendo ao ciclo da vida: "Na viração do dia". Porém, era uma presença real. A queda, então vai modificar radicalmente o relacionamento entre Deus e o homem. Com isso, as consequências tanto para a criação, quanto para o relacionamento com a mulher também sofrerão transformações drásticas.

     O relacionamento mudou a partir do momento que a atitude do homem para com Deus se alterou após ambos, pela ordem, mulher e homem, terem comido do fruto da árvore da ciência do bem e do mal. Mudou entre eles, pois, ao se verem nus, envergonharam-se mutuamente e ao ouvirem a voz do Senhor encondem-se e fogem de sua presença. Antes da queda a presença divina não era sinônimo de manifestação de juízo, e obedecia ao ciclo natural. Mas, agora, ela tanto é uma forma de Deus manifestar seu juízo assim como executar sua ira implacável contra todo e qualquer tipo de iniquidade praticada pelo homem. Agora, ela é sobrenatural e se constitui em um dos aspectos de revelação da soberania divina. E a partir do momento que o homem manifesta a Deus que se escondeu de sua presença pelo fato de estar nu, percebe-se também que por causa dessa falta cometida pelo homem, que Deus também não mais reconhece o homem, e, por isso, também o procura . A pergunta divina oferece a chance dele se justificar ao indagar: "Quem te mostrou que estavas nu?" Esta pergunta é completada pela seguinte que imediatamente o Senhor faz: "Comeste tu da árvore que te ordenei que não comesses?

     As duas perguntas divinas podem e devem ser olhadas e analisadas em separado. Na primeira pergunta, muito embora o Senhor saiba que não havia ninguém além do próprio homem que pudesse lhe mostrar a sua nudez. E, ambos, tanto homem quanto mulher se descobrem nesta situação de vergonha e nudez após o homem também ter comido do fruto. O texto é claro ao relatar que enquanto somente a mulher tivesse consumido do fruto nada se alterou quanto ao sentimento de vergonha. Mas, bastou que o homem também comesse do fruto pra que se aflorasse este sentimento em ambos. Então surge a segunda pergunta, pelo fato de o homem não ter em quem apontar na primeira pergunta divina. Com a segunda pergunta, surge então as justificativas, que eu as reputo como evasivas e que tinham como principal objetivo se eximirem de responsabilidades. Esta situação é analisada por alguns pensadores que se debruçaram sobre a questão do mal no no mundo e concluíram que o mal é contingencial. Ele não se explica. Na pergunta seguinte feita ao homem, a resposta foi a mulher que tu me deste por companheira. E a mulher atribui a sua falta a serpente que a enganou.

     Deus cobrou responsabilidades de todos e da mesma forma passa a sentenciar seus juízos a todos conforme o nível de participação dos mesmos. Ele sentencia a serpente a se rastejar sobre a terra e a comer pó todos os dias de sua vida. Além do que, haverá uma inimizade tal entre a serpente e a mulher e entre a descendência da serpente e a descendência da mulher. Eles serão inimigos e estarão sempre se ferindo. A serpente no calcanhar do homem e o homem na cabeça da serpente. Em sua sentença sobre a mulher, ela será o objeto pelo qual o homem marcará sua ação dominadora e subjugadora. Ela não terá desejo, já que o desejo dela será para o marido e ele exercerá domínio sobre ela. Esse juízo específico sobre a mulher mostra bem o que foi a sua ambição. Muito embora na alegação de sua defesa diante de Deus, ela tenha dito que a serpente a enganou, e não resta dúvida de que ela fora enganada. Mas, foi a sua ambição pelo sentimento que ela criou em ser igual a Deus que a traiu e a levou à situação que agora ela se encontra.   

     Um outro dado que não pode ser omitido nesse juízo divino a cerca da mulher, é o fato de que ela fora criada da costela do homem e que também tinha como função, eventualmente, e, num futuro bem próximo, a gestação e procriação. Isto foi dado da parte do Senhor como mandamento(Gênesis 1:28). O juízo de Deus a cerca da mulher não seria a maternidade e sim a forma como esta maternidade aconteceria. Seria sob intensa e pesada dor. Uma coisa que ficou clara no juízo divino a cerca do pecado cometido por Adão, foi o fato de que, muito embora soubesse da proibição terminante da parte do Senhor pra que não comesse daquele fruto. Ele ainda assim deu ouvido a sua mulher e comeu do fruto. E, por conta disso, a terra foi amaldiçoada. O homem ainda vai tirar durante muito tempo o seu sustento da terra. Mas, haverá sempre muito sacrifício. A terra não apenas produzirá frutos para seu deleite. Espinhos e cardos a terra também produzirá. A terra como marca da Criação que seria uma forma de produzir prazer ao próprio homem. Agora, também se constituiria como um lugar bastante inóspito para a ocupação humana.

   O verso 19 marca então que como consequência da desobediência do homem, sua sina durante o tempo em que estiver sobre a face da terra será em meio a tantas dificuldades. Sua trajetória de vida será marcada pelo esforço desmedido pela subsistência que lhe custará, acima de tudo, sua vitalidade. A consequência de tudo isso é que, num determinado espaço de tempo, essa vitalidade do homem acabará se esvaindo e então, ele voltará de onde ele mesmo saiu, ao pó da terra. Outro fato que também chama a atenção neste capítulo diz respeito a relação tanto do homem quanto da serpente que eles terão com o "Pó da terra". Ao proferir seu juízo sobre a serpente, o Senhor lhe amaldiçoa dizendo que ela a partir daquele momento comeria do pó da terra, já que, impreterivelmente teria que se rastejar(V. 14). Ao mesmo tempo, em que a sentença divina para com o homem ocorre quando o homem se dá conta de sua finitude e do destino que lhe espera, o pó da terra. Ou seja, o tentador e aquele que foi tentado e se deixou seduzir pela tentação têm seus destinos atrelados.




IV - MARCA INDELÉVEL DE UMA DOMINAÇÃO. (V. 20)


     Achei necessário e inevitável separar tão somente o verso 20 para desenvolver neste tópico pelo fato de que agora, e, após a queda, e todas as partes envolvidas neste processo, ou seja, o homem, a mulher e a própria serpente tendo já recebido seus respectivos juízos divino. Pudéssemos abordar essa marca característica do homem a qual herdou e desenvolveu ainda no jardim e antes mesmo de pecar. Relembremos o que Deus deu como prerrogativa ao homem na sua criação e que está registrado no verso 26 do capítulo primeiro. E ali, numa afirmação em tom imperativo que ele DOMINE sobre absolutamente tudo. Mas, esta era uma prerrogativa que tinha limites. E o seu limite era a mulher. Tanto isto é verdade que quando o Senhor no capítulo 2, verso 19, apresenta ao homem todos os animais do campo e toda ave dos céus pra que este pudesse lhes dar nomes, a mulher ainda não havia sido criada. E quando o Senhor lhe apresenta a mulher, ele não lhe põe um nome; porém, lhe atribui uma qualidade.

     Agora, a situação se alterou drasticamente. Eles já possuem o discernimento moral e o olhar de Adão para com a mulher também muda. Não somente o olhar, bem como a forma de tratamento. E a marca distintiva dessa nova realidade e relação com  a mulher que será construída, terá como base a dominação masculina. Não nos esqueçamos de que a dominação da qual estamos falando é consequência do juízo divino emitido à mulher após sua desobediência ao comer do fruto que não lhe fora permitido comer. Deus foi categórico ao afirmar no final deste verso a mulher: "O teu desejo será para o teu marido, e ele te dominará" (Gênesis 3:16). Então, e tão somente agora, o homem olha para a mulher e lhe chama de Eva. Sobre todos os animais do campo e etc. a que ele Adão nominou, ele também alcançou domínio sobre os mesmos. Não será diferente com a mulher a qual ele está nominando de Eva.

     Basicamente no desenvolvimento de qualquer ciência, principalmente nas que se dedicam a estudar a natureza, como a Física, Química, Biologia e etc. Desenvolve-se o que comumente chamamos de uma NOMENCLATURA. Os experimentos e as descobertas consequentes exigem uma catalogação de valores e enunciados que ajudam na construção e reformulação, já que são dinâmicos, de um sistema montado e que buscam especificamente construir domínio sobre um determinado conhecimento ou tecnologia. Então basicamente, se o homem é capaz de desenvolver um sistema de notação científica que chamamos de nomenclatura tendo em vista o domínio de uma determinada expertise, isto significa que ele tem domínio completo sobre o objeto de seu conhecimento. Portanto, ele é capaz de nomeá-lo e por isso nomeia. Dar nome, em outras palavras é exercer domínio, pois quando ocorre existe conhecimento sobre o que se nomina.

     Quando o homem, Adão, foi capaz de chamar sua mulher de Eva. Ela, agora conhecida por Eva, se encontra sob o domínio do homem. E claramente revela o cumprimento de uma maldição a que estava destinada a mulher no juízo divino. Esse tipo de maldição se revelará pelo papel agora dado a mulher, agora nominada por Eva. O que está claro neste verso, é que o homem trás como sua marca do ponto de vista de seu relacionamento com a mulher, a dominação. Esse tipo de dominação se perpetuará ao longo dos séculos em quase todos os povos e suas culturas. E, de acordo com os registros históricos e dados arqueológicos dessas várias culturas, nunca foi uma prerrogativa da cultura ocidental e cristã.  




V - CONSEQUÊNCIAS DA DESOBEDIÊNCIA PARA COM A CRIAÇÃO.(V. 21)


     Já foi falado aqui que a desobediência do homem alterou drasticamente o relacionamento de Deus para com o homem. Do homem para com a mulher. Assim como do homem para com a Criação. A primeira atitude do homem e da mulher após cometerem o ato de desobediência e perceberem que estavam nus foi coserem folhas de figueiras para esconderem a nudez de ambos. As folhas de figueiras não tinham sido criadas com este objetivo, mas naquele momento elas foram a solução imediata para um problema urgente e o homem lançou mão deste expediente. 

     Da mesma forma, aquela fauna, conjunto dos animais criados por Deus. E que o próprio Deus trazia cada um para que o homem pudesse dar nomes a eles. Também sofrerá graves danos ou consequências em função da desobediência. Eu já vi em alguns vídeos postados na WEB quando um animal caminha para o abatedouro e ele pressente o inevitável que é sua morte. Como ele reluta em entrar naquele lugar. De uma maneira geral, somos todos resistentes ao que nos aguarda como destino final. De alguma forma trazemos em nossa natureza aquele vestígio ou característica de sentimento de que não fomos criados para termos um destino tal qual aquele que nos aguarda.

     As folhas de figueiras no verso 7 deste capítulo foram um expediente imediato e paliativo como já foi falado. Porém, agora no verso 21, e, de forma providencial, Deus transforma peles de animais em vestimenta para Adão e Eva. Se são peles de animais, esses animais tiveram que ser sacrificados. Durante muito tempo e com o objetivo de se proteger dos flagelos que o clima traz para com o homem, as principais vítimas serão os animais. Eles não apenas fornecerão vestimenta, mas passarão a fazer parte da cadeia alimentar do homem para sua própria subsistência. De uma maneira bastante sintética, o dano provocado pelo homem ao meio ambiente e este compreendido entre fauna, flora e etc. é incomensurável.




VI - LANÇADO À SUA SORTE E SOBREVIVÊNCIA(V.V.22-23)


     O que estes derradeiros versos nos proporcionam a nível de reflexão, faz com que percebamos que se por a caso o homem permanecesse naquele ambiente de jardim criado para que ele ali vivesse, muito embora tivesse desrespeitado a ordem divina. Ele ainda assim estaria em uma situação bastante cômoda. Deduz-se também que as punições impostas a ele, a mulher e a serpente não teriam um mínimo de efetividade. Logo o efetivo cumprimento dos juízos divino estavam atrelados a expulsão dos infratores do jardim.

     O ato de comer do fruto que segundo a tradição daria ao homem a habilidade de discernimento entre o bem e  o mal, leva-nos a ideia de uma percepção e apropriação do caráter significativo da palavra saber atrelado à sua etimologia. O latim SAPERE se refere àquele que tem bom paladar, tem cheiro, ou sentir por meio do gosto. Se recapitularmos o que já se falou neste texto. Principalmente nos momentos que precederam ao ato que culminou com a desobediência do homem. Percebemos que os aspectos sensoriais por parte da constituição e função dos órgãos dos sentidos do homem estiveram em ação. 

     A mulher VIU que a árvore era agradável aos olhos. O sentido da visão foi aguçado. Evidentemente, que muito embora a capacidade de apropriação do real por meio da estética fosse uma realidade, essa mesma capacidade não foi suficiente para alertar acerca da iminência do perigo. Não há ainda por parte do homem o domínio de sua capacidade de abstração. Este tipo de habilidade se desenvolve a partir de uma experiência concreta e conjunta. A experiência primeira que resulta na desobediência foi concreta, porém de maneira estanque e isolada. A mulher viu que a árvore era agradável aos olhos e boa de se comer e comeu. Depois deu ao homem e ele também comeu. Eles não entraram num consenso para a prática de tal ato. A questão de o homem ser uma emanação divina já explica esta situação, enquanto que a mulher segundo o homem é : "Esta é agora osso dos meus ossos e carne da minha carne."

     O cuidado divino para com sua criação e o zelo que neste tópico se revela pelo jardim fica bastante evidente já que os agora infratores não mais poderão viver naquele local. E a providência divina é urgente uma vez que tanto o homem quanto a mulher poderiam naquele momento direcionar seus olhares para a outra árvore, a árvore da vida. Conclui-se que o homem não foi criado como um ser eterno. Ele desde a criação trazia consigo algo que o distinguia do seu criador que era e sempre foi sua finitude. A árvore da vida era a sua grande salvação como recurso disponível e imediato contra o fantasma de sua finitude. Logo, a única providência imediata e divina naquele momento seria lançá-los fora daquele local.

     Assim Deus agiu. Lançou o homem fora daquele jardim com o objetivo de lavrar a terra da qual o homem fora tomado. De um modo geral o homem estava naquele lugar para ocupar a função de jardineiro do Senhor. Ao mesmo tempo que desempenhava esta função estaria também gozando da presença e da comunhão divina. Mas o homem ao transgredir as regras de seu Senhor. E isto se chama quebra de confiança, quis ocupar o lugar que não era seu. Ele pretendeu ocupar o lugar do seu Senhor. Isto também pode ser chamado de usurpação. Então, o Senhor delibera expulsá-lo daquele jardim e o próprio Deus se encarregaria de lavrar a terra, função esta que estava reservada ao homem.

     Outra coisa que quero chamar a atenção neste tópico, diz respeito a forma como Deus delibera ou age a cerca do futuro do homem. Ao transgredir a norma divina o homem conseguiu o status divino de ser também um ajuizador de suas ações. Portanto se equiparou a Deus neste quesito. Entretanto, é Deus ainda o Senhor do destino do homem. Em que pese as muitas leituras e interpretações surgidas no transcurso da história bíblica tanto no tocante a Gênesis 1:26 quanto ao capítulo 3:22 com relação ao uso de formas no plural para se referir a Deus. E estas leituras são múltiplas e variadas, repletas de nuances por parte de cada especialista. Uma das leituras e mais recorrente desde os pais da igreja, dá-nos conta de que há por parte do Senhor uma espécie de ironia ou sarcasmo.

     É fato que o homem teria que ser expulso do jardim e tanto nesta situação quanto em Gênesis 1:26, já que em ambas o que está em jogo é a criação do homem e o seu destino respectivamente. O uso do plural para autenticar um ato divino é recorrente. Ele será expulso do jardim e a sua capacidade adquirida através da árvore do conhecimento do bem e do mal será instrumento e ferramenta para sua sobrevivência sob pena de perecer em um terreno inóspito fora do jardim. O jardim aparentemente lhe dava todas as condições para uma vida de trabalho, porém tranquila e sem maiores sobressaltos. Fora do jardim, o homem terá que criar as condições necessárias para trabalhar e para sua sobrevivência. E foi o que aconteceu quando o Senhor o lançou para fora do jardim. Ele foi lançado à sua própria sorte e sobrevivência.




VII - SEM CAMINHO DE VOLTA, COM A FINITUDE E SEM ACESSO À ÁRVORE DA VIDA.(V. 23)


     É fato que havia duas árvores no centro do jardim. E que efetivamente apenas sobre uma, a árvore da ciência do bem e do mal estava imposta a proibição de se comer e muito menos tocá-la. A advertência quanto a uma possível desobediência era a morte. Este primeiro passo ou etapa no destino e nas ações do homem ainda estando sob o propósito da criação divina fora quebrado devido a seu ato de desobediência, e eles tiveram que ser expulsos do jardim. Foi uma penalidade sem volta. Muito embora o homem fosse criação divina e não fora criado para ser eterno. Sua perenidade dependeria de sua fidelidade para com Deus. Foi uma tentação vindo de uma alteridade e simbolizada pela serpente que provocou este estrago e com sérios danos a sua integridade física, moral e espiritual.

     Outro dado que não podemos omitir e que fora referenciado no parágrafo anterior é que o homem não fora criado para ser eterno. Sua longevidade-perenidade dependiam de sua relação com Deus e do ambiente em que estava inserido, neste caso o jardim. Porém a tentação de se apossar de tudo, uma vez que mesmo estando no jardim ele não possuía essa prerrogativa se acendeu a partir do modo em que a serpente(Uma polaridade diferente da divina) acena com a possibilidade de se igualar a Deus. Ao mesmo tempo que distorce o mandamento e proibição divina. É fundamental que se perceba também que o mandamento e proibição divina ainda está atrelado ao ciclo de caráter natural. A pessoa cometeu tal erro e para tanto há uma punição prevista, neste caso, a morte física. Toda uma capacidade de leitura simbólica por parte do homem a cerca do que efetivamente poderia representar pra ele a morte, ainda inexiste.

      Ou seja, foi pelo ato de desobediência do homem que ele é inserido nas categorias da finitude, melhor dizendo, ele toma consciência de sua finitude. Existe um divisor de águas por parte de alguns teólogos e este parâmetro é também conhecido pela correlação entre Essencialista_Existencialista. É uma discussão que dá pano pra manga e de certa forma a condução deste texto não tem se omitido em dialogar com este parâmetro, entretanto, ainda carece de uma apropriação e descrição mais abrangente e que lamentavelmente não será observado aqui e neste momento. O fato mais emblemático deste tópico é a expulsão do homem daquele lugar paradisíaco e sem qualquer possibilidade de retorno àquele mesmo lugar e a seu modo de vida. A não possibilidade de retorno está atrelada ao ato divino devido à quebra de confiança para com o homem. Fora posto uma sentinela, caso o homem não estivesse também disposto a obedecer a ordenança divina.

     A sentinelas também conhecidas como QUERUBINS, estavam ali tão somente por uma razão. E não necessariamente por causa de uma invasão do jardim. E sim pelo fato de que agora, o homem, por estar inserido de fato na dimensão da finitude. Sabendo exatamente o que significaria aquela morte que o Senhor lhe havia posto por advertência caso comesse da árvore que lhe estava proibida de comer. A sentinelas estavam ali para guardar a árvore da vida. Do ponto de vista da tentação, e aquele que dela fez uso para que o homem caísse, era interessante que agora o homem buscasse a outra árvore que também estava no centro do jardim, a árvore da vida. Talvez fosse interessante que o homem vivesse eternamente e de forma depravada. Mas, não se pode omitir que quem efetivamente ainda está no controle de tudo, muito embora o homem tenha desobedecido a Deus caindo na tentação da serpente, ainda é o Senhor e criador de tudo. A forma como Deus operou a partir do momento que o homem foi expulso no jardim, mostra que o controle de tudo ainda está e permanecerá em suas mãos.

     O caminho de volta do homem para o jardim está deliberadamente por vontade divina vedado. A partir daquele momento a finitude faz parte literalmente de sua vida e consequentemente de sua existência, já que é desta forma que ele fora inserido nela. E sem acesso a árvore da vida, logo nenhuma chance de retorno ao jardim e ao patamar de vida perdido. A temática existencialista nos dá conta desse estar aí, que segundo o pensador Martin Heidegger, é o Da-sein. A solitude humana e seus desafios é uma realidade constante e através dela toda sorte de medos e pavores tomam conta de nosso ser. 





CONCLUSÃO


     O que mais nos chama a atenção neste capítulo 3 de Gênesis é que de uma maneira ou outra fomos criados com um instinto, ou centelha de liberdade. Esse conceito de liberdade foi sendo programática e paulatinamente construído neste texto. Ele culmina com uma ato de desobediência e, mesmo na desobediência fomos livres para cometermos tal ato. Evidentemente, que não sem termos também construído o conceito de consequência que os nossos atos acarretam. Percebe-se na condução e leitura deste capítulo uma preocupação descritiva e sequencial até o momento em que efetivamente  ocorre uma quebra de autoridade ante ao que naturalmente fora estabelecido. Enquanto a árvore que está no centro do jardim é apenas uma possibilidade de extrapolação ao naturalmente estabelecido, tudo que eventualmente teria um dimensionamento de eventuais contingências passam despercebidos. 

     O que se pode chamar de desobediência, uma vez que havia sim um limite previamente estabelecido, também pode ser entendido como vocação para a liberdade. Ou até mesmo esse tipo de correlação entre essencialismo_existencialismo. E a transição de um para outro de forma brusca e contundente denota que a existência de traumas psíquicos entranhados em nossa estrutura emocional se revelam nas próprias neuroses que por nós são diagnosticadas. Pagamos um preço bastante alto por nossa liberdade e isto não tem muita relação com a habilidade adquirida pelo consumo do fruto de uma árvore que não deveríamos consumir. A tal árvore apenas nos daria a capacidade de discernimento maior do que aquele que se possuía antes da queda. Logo, a questão do arbítrio ou do livre arbítrio, não é relevante pra discussão neste momento. Até porque, ele será um conceito construído a partir de uma moralidade advinda com a queda pela desobediência.

     A construção de uma moralidade somente se torna possível entre os seres humanos e estes vivendo em grupo. A começar pelo próprio texto, e naquilo que durante o seu desenvolvimento fora abordado, a moralidade é uma construção horizontalizada e grupal. Não havia nenhuma possibilidade de sua construção quando o homem ainda se encontrava só. Mesmo depois da criação da mulher e antes da queda, ainda existiu um limite para a construção dessa moralidade, também pelas razões apontadas no desenvolvimento desta leitura e na existência de uma relação entre o homem, emanação divina, e a mulher uma emanação de Deus a partir do homem(Ossos dos meus ossos).

     A árvore que dava discernimento entre o bem e mal, do ponto de vista físico e espacial do homem era tão somente uma árvore proibida pelo perigo que representava a uma também finitude humana ainda não experimentada. Ela era, portanto, um objeto simbólico e representativo das reais possibilidades e limitações da natureza humana. Ela era tão agradável assim como os seus frutos para se comer quanto era qualquer uma das demais árvores plantadas no jardim. Mas, ela estava no centro do jardim e quem sabe estivesse ali apenas para a contemplação?

     A questão levantada nesta leitura a cerca da afirmação de que Deus é ou não o criador do mal. Mostra algumas nuances no tratamento deste assunto. Uma das hipóteses aqui levantadas para isentar Deus desta afirmação(Acusação) é o elemento gramatical para discernimento do mal não como algo que tenha ser ou substância. E isto foi comentado na introdução deste texto. A minha opção em olhar o mal do ponto de vista de sua contingência. Ou seja, ele pode acontecer ou não e não há nada que possamos fazer para evitá-lo dá bem, e, de igual modo, o entendimento de sua  tendência para que aconteça é, deveras, repleto de dramaticidade e elementos trágicos.

     Adquirir o conhecimento ou discernimento do bem e do mal, não é necessariamente a solução para os problemas do mundo. Muito menos, de posse de tamanha capacidade atribuir todos os males do mundo a Deus, não é sinônimo de sabedoria. Pelo contrário, essa capacidade trouxe-nos pesadíssimos fardos. E é exatamente essa capacidade que revela o  quanto somos incapazes de resolvermos nossos problemas, ainda que sejamos perfeitos em diagnosticá-los(Capacidade para discernimento). Como alguém certa vez ao analisar o mito da medusa comparou-a a aquilo que o pensamento faz conosco quando nos petrifica. Talvez, também possamos afirmar a mesma atitude no homem ao contemplar a árvore e se sentir petrificado por ela(Viu que era agradável e boa de se comer).

     A grande dificuldade até aqui, talvez, tenha sido, a partir do desenvolvimento desta temática, a não ênfase em uma construção do tipo poética que fosse suficiente em alavancar a construção e sintaxe de imagens. O desenvolvimento até este momento conduzido limitou-se sim na utilização de recursos sinestésicos, mas que não levasse em consideração o principal elemento e pivô de todo esta abordagem. E que, afinal de contas, proporcionou esta situação trágica e irreversível ao homem a ponto dele ser alijado do Jardim e da presença divina. Neste caso, e pelo fato de ao se desenvolver esta temática neste texto, o objetivo era de listar cada situação ou problema antes e depois do fato ocorrido em Gênesis capítulo 3 e que culmina com a expulsão do primeiro casal do jardim.

     E como fiz menção, agora, e de forma mais específica do recurso sinestésico relacionado ao sentido da visão. Vale lembrar que, ao longo deste texto, houve também uma grande preocupação em não se atribuir algum valor de qualquer obra e produto da criação divina em detrimento de outro produto ou criação. Tanto isso tem procedência, que a mulher ao contemplar a árvore da ciência do bem e do mal e concluindo que ela era agradável aos olhos, foi feita a observação de que todas as árvores e a criação como um todo possuíam a mesma característica de beleza. Então voltamos novamente àquele assunto de que já fizemos menção a nível de entendimento por meio de uma ferramenta mitológica e que portanto foi capaz pra que se alcançasse o objetivo. Para tanto, tanto a mulher quanto o homem negligenciaram a advertência divina de que não comesse do fruto da árvore em questão sob pena de que pudesse pagar com a própria morte. Essa negligência denota o caráter seletivo no sentido. Já que, num primeiro momento a mulher, e depois o homem, sufocaram a advertência verbal da parte de Deus.

     Numa rápida descrição do real enquanto Criação e o contexto do jardim. Há uma maior exuberância de imagens, e não é pra menos, em detrimento de todo o contexto de criação que teve como seu principal elemento gerador a própria palavra de Deus. A proposição em forma descritiva no segundo momento da criação no capítulo 2 dá bem o tom dessa dinâmica na relação direta com a forma. Não existe nada de real sem a forma que em si complementa a dinâmica.  O próprio Deus ao final da Criação, ainda no capítulo 1:31, segundo o relato do texto disse ao olhar a sua obra: "E viu Deus tudo quanto tinha feito, e eis que era muito bom". Não resta dúvida de que o pecado cometido pelo homem no jardim foi o pecado da desobediência. Esse pecado soa como hybris, uma espécie de violência e que tem como única meta provocar algum tipo de distorção. E foi o que houve.

     Ainda que o objetivo do qual me imbuí neste texto tenha sido o de fazer uma leitura que fosse bem mais descritiva do que propriamente uma intenção de caráter bíblico e dogmático. Não há como não mencionarmos que, a despeito de qualquer coisa, ela também nos proporciona uma maneira de olharmos, visitarmos e revisitarmos doutrinas como a do pecado, do homem, da criação e porque não a doutrina do mal como elemento diferencial da doutrina pecado. O que, impreterivelmente nos leva direto a um outro debate que não fez parte da abordagem deste texto que é o livre arbítrio. Muito embora não seja um termo ou expressão que faça parte da literatura bíblica. Em diversas ocasiões pode se encontrar Deus dando ao homem a capacidade de decidir sobre algumas questões que lhe dizem respeito. Não é este o caso que foi discutido aqui. Pois em nenhum momento Deus deu algum tipo de prerrogativa quanto ao homem escolher sobre comer ou não do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal. Pelo contrário, ele estava terminantemente proibido de fazer tal coisa.

     O mesmo se pode dizer a cerca da doutrina do mal neste capítulo 3 e que não há sentido algum para estar sendo analisado. O que fica patente é a existência do MAL enquanto elemento de composição tal como o BEM daquilo que se pode chamar de moralidade e que antes mesmo da criação era uma realidade do ponto de vista do ser divino. A árvore da vida era o instrumento mitológico que simbolizava presença tanto do bem quanto do mal e, o que também chama a nossa atenção, é o fato dela estar localizada no centro do jardim. Mas do que a sua formosura, o que chama a atenção é sua localização. Bem no centro do jardim, como se naquele local e por ela se constituir na árvore que portava a capacidade e o conhecimento do bem e do mal. Era o ponto de equilíbrio daquele local plantando por Deus.

     Não houve livre arbítrio do homem para comer do fruto que lhe fora proibido. Não houve prática do mal quando o homem e a mulher comeram daquele fruto. Houve sim a prática do pecado da desobediência. E, por intermédio desse pecado, o mal tomou ocasião para se fazer de fato presente no mundo e entre os viventes de um modo geral. Já foi falado aqui, mas nunca é tarde para lembrar que o mal é contingencial. E o fato de sermos moralmente pessoas equilibradas, ainda assim, ele impreterivelmente está presente entre nós e nunca sabemos como ele acontece e quando acontece. De certa forma, ele pode se manifestar em alguns aspectos da vida humana. Principalmente ao nos reportarmos a questão do tempo e sua consequente inexorabilidade.

     Quero terminar estas linhas, não da mesma forma como comecei. Uma vez que ao propor uma abordagem temática sob a forma de indagação, poderia ser que estivesse em dúvida quanto a origem do mal, ou mesmo que tivesse a propensão em atribuir a sua origem e paternidade a Deus. E termino então, de maneira doutrinária, dogmática e bíblica afirmando que Deus não é e nunca foi o autor do mal. Ele é o criador de todas as coisas e tudo quanto criou tem ser e é muito bom. A Ele toda a glória, Soli Deo gloria !!! 
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